” A fotografia, e mais tarde a invenção do cinema, vieram fornecer à cultura moderna uma ferramenta essencial para contrariar aquilo que parecia tornar-se cada vez mais rápido: o fluxo do tempo. Com a possibilidade de captar o mundo percebido numa placa, num papel, o homem moderno envolveu-se obsessivamente numa urgência de registar, de envolver o seu quotidiano no maior número possível de imagens que o duplicam e relatam. Isso só foi possível pelo estatuto documentalatribuído à imagem técnica que convoca, como dizia André Bazin, “a crença irracional” na objectividade da imagem fotográfica.
Esse foi o aspecto central da História da fotografia, a forma como ela moldou o olhar do homem moderno a essa permanente mediação pelo efeito de convocação do real que promove. Foi esse estatuto epistémico, de verdade apodíctica que moldou sempre as diferentes formas como nos fomos relacionando com a fotografia: contornando-o, procurando negá-lo com efeitos ‘pictóricos’ (pictorialismo), convocando-o na sua vernacularidade (fotojornalismo), usando-o no seio de reflexões estético-políticas (arte conceptual), ou, hoje, usando para reflectir sobre o passado da própria história da fotografia (a procura de arquivos analógicos, a reflexão sobre o snapshot no espaço da galeria de Arte e do Museu). Nesta comunicação convocar-se-ão esses diferentes registos, que vão do naturalismo fotográfico à fotografia do sobrenatural, para interrogar a ontologia fotográfica e apresentá-la, não tanto como um registo paradoxal (entre o documento e a construção, entre a ‘natureza’ e a ‘cultura’), mas como o limite negativo, um grau zero do sentido. Para lá do índice e aquém do ícone, o estatuto documental da imagem (no papel, no écrã de computador, no telemóvel) coloca-a, irremediavelmente, no papel não como uma ‘mensagem sem código’ (Barthes), mas de um objecto ‘assimbólico’.”
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